Em mim, ó inominado, ó infigurado, ó transfigurado, em mim subsistes. Sémen primeiro e perene, aparição absurda no vazio, nódulo subtil e diáfano, continente microcósmico de todo o cósmico, ímpeto puro, movimento puro, espectacular súbito actor original, haver ser no não-ser, espaço conquistado ao nada, tempo inventado, átomo, molécula, ínfima partícula, verbo indizível, minúsculo, majestoso, pequena gigantesca energia, forma matéria achada, em mim subsistes, existes, persistes, vives crescendo até à altura do infinito, teu-meu fito neste atroz, maravilhoso porto em que me debato. Noite alta, o sonho explode, a angústia, esperança, saudade, estranheza de entre-acordar e entre-viver, emersão em véus, objectos, emoções que se dissipam num quotidiano mal recuperado. Noite alta, ó inominado, sou em ti o enigma de aparecer, de aparecer-me e ser. António Quadros, em Imitação do Homem. Odes,
Lisboa, Espiral, 1966.
|